quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

O SISTEMA FACH DE CLASSIFICAÇÃO VOCAL – PARTE 2

O SISTEMA FACH DE CLASSIFICAÇÃO VOCAL – PARTE 2

LIVRO: “The Opera Singer’s career guide – understanding the European Fach System”
AUTOR: Pearl Yeadon McGinnis (editado por Marith McGinnis Willis)
EDITORA: The Scarecrow Press, Lanham, 2010
TRADUÇÃO: Charles Yuri Custódio – chayuc@gmail.com – http://www.facebook.com/studio.cyc

OS ELEMENTOS DETERMINANTES DO FACH
            Há vários fatores determinantes do “Fach” de um cantor. Isso inclui o equipamento vocal básico de um cantor (voz), combinado com sua tessitura, “tamanho” da voz, timbre,  características físicas, aparência, idade, experiência, freqüência de performance, desejo e personalidade.
            Como a voz de um cantor soa é o fator inicial determinante do “Fach”.  Isso depende muito nas características do aparelho vocal, relacionadas diretamente com a fisiologia e anatomia do indivíduo. Um soprano de estrutura corporal pequena dificilmente possuirá uma voz dramática consistente. O mesmo se aplica a uma soprano alta, forte e com “ossos largos”. Dificilmente possuirá uma voz leve, doce e ágil (para uma discussão mais aprofundada sobre o aparelho vocal, leia o livro de William Vennard: “Singing: themechanismandthetechnic”).
            Certamente existem exceções, como Dame Joan Sutherland, uma imponente mulher com quase 2 metros de altura. Inicialmente, ele estudou Wagner, até que descobriu que possuía talentos para o repertório de “soprano lírico coloratura” e “soprano dramático coloratura”, especialmente as óperas de Bellini e Donizetti. Beverly Sills era também uma mulher alta e imponente. Ela primeiramente ficou conhecida internacionalmente como uma especialista em Handel, mas rapidamente se tornou famosa como uma especialista em belcanto, ou seja “o canto de passagens cantábile (fluídas e harmoniosas) com pureza, suavidade e acabamento artístico, como na tradição italiana”. Contudo, a maioria dos cantores de ópera pode ser classificados inicialmente por suas características físicas, as quais, frequentemente, corresponderão com sua sonoridade vocal.
            Os papéis em ópera foram desenvolvidos para corresponder a essa relação entre constituição física e sonoridade vocal. Fadas, duendes e elfos são cantados por crianças ou por vozes líricas leves. Os personagens jovens, como um filho ou filha são cantados por vozes líricas e leves. Reis, pais, condes, demônios e fantasmas possuirão vozes mais escuras. Esse mesmo sistema de classificação pode ser observado no teatro musical norte americano.  O tenor, frequentemente, é o mocinho. E possui uma voz mais aguda, melodiosa e suave do que o perigoso, e, por vezes, ainda atraente canalha, normalmente interpretado por um barítono ou baixo com qualidades vocais que soem grosseira e ameaçadora. Um grande exemplo dessa comparação vocal pode ser observado no herói Curley e no vilão Jud, do musical “Oklahoma”, de Rodgers and Hammerstein.
            Do mesmo modo, uma personagem jovem e doce, como Barbarina, da ópera “As Bodas de Fígaro”, de Mozart, deverá possuir uma voz aguda e leve. Por outro lado, personagens mais maduras, até mesmo com leve toque de loucura, como Elektra (na ópera homônima de Richard Strauss), deverá possuir uma voz mais rica, com sonoridade mais dramática.
            Outro exemplo dessa relação entre constituição física x constituição vocal pode ser observada no personagem heróico, forte e poderoso de Tristão, da ópera de Wagner “Tristão e Isolda”. A escolha de um tenor lírico poderia parecer estranha em um personagem tão poderoso.

VOZ
            A voz é o primeiro elemento determinante na escolha do “Fach” de uma pessoa. É prudente considerar a voz como um instrumento e desenvolvê-la tão “friamente” quanto qualquer outro instrumento. Cantores freqüentemente se referem a suas vozes como se fosse uma entidade à parte. Em alguns aspectos, isso é verdade.
            A voz é constituída de vários fatores. Tanto biológicos, quanto emocionais, psicológicos e culturais. Todos nascem com certa organização genética que provavelmente determinará o tamanho das pregas vocais. As características físicas fundamentais de uma pessoa são responsáveis, também, por determinar a largura e o comprimento das pregas vocais, a musculatura intrínseca da laringe (que está envolta das pregas vocais) e demais características do aparelho vocal. Isso inclui a consistência do muco responsável pela lubrificação das pregas vocais; o formato e tamanho das cavidades de ressonância, responsáveis, inclusive, pelo “tamanho” e “cor” da voz; além de características respiratórias (sopro aéreo), sem as quais não é possível produzir som algum.

TESSITURA (adaptações foram feitas pelo tradutor)
            A tessitura é o segundo elemento determinante do Fach de uma pessoa. No Brasil utilizamos o termo extensão para determinar quais notas o cantor conseguem cantar (da mais grave a mais aguda) e usamos o termo tessitura para designar quais notas, ou região de voz, o cantor realmente usará para cantar. Extensão e tessitura são determinadas pela constituição física, mas também são modificadas e aumentadas pelo treino vocal. Um cantor profissional não necessariamente cantará em toda sua tessitura. Um exemplo que pode ser citado é o de Birgit Swenson, uma soprano dramática, cuja extensão ia do F#2 até o F#5 do repertório das sopranos coloraturas. No entanto, a maior parte de seu repertório requeria que cantasse entre C3 e C5 (eventualmente, um C#5).
            Tessitura pode ser definida como a parte da voz que pode ser cantada consistentemente, com facilidade e beleza. Essa será a tessitura do cantor – aguda, média ou grave – a parte da voz aonde o cantor pode se expressar mais eficazmente. Tessitura, do italiano, significa textura e pode também indicar a região aonde a maior parte das notas de determinado papel se situará.

TAMANHO (obs do tradutor: referindo-se a poder sonoro)
            O tamanho da voz também é determinado pela constituição do aparelho vocal, mas também pode ser desenvolvido através de treino. Tamanho pode se referir a vários fatores, como a quantidade de “massa” sonora que um cantor consegue produzir e seu efeito dramático. Um cantor deve, frequentemente, ser capaz de utilizar uma voz “grande” para que consiga se sobrepor a orquestrações pesadas, ou uma voz “leve”, para que consiga sustentar passagens leves e agudas. Outros elementos influem na impressão de tamanho, tais como controle do fluxo aéreo, a habilidade de sustentar as características vocais por períodos extensos e o próprio timbre pessoal.

TIMBRE
Timbre pode ser descrito como a “cor” de uma voz, muitas vezes referindo-se às suas características vocais básicas. O timbre é determinado parcialmente pela constituição física do aparelho vocal mas, em grande parte, é determinado pelo treino vocal. Alguns conhecimentos físicos podem ajudar a analisar o timbre vocal de um cantor, como os conhecimentos acerca de harmônicos, parciais, formantes e análise espectral, todos relatados com questões de ressonância, que, juntos, produzem diferentes sensações de timbre. O famoso professor de canto Italiano do século XIX, Giovanni Battista Lamperti, disse que “a presença de ressonância na cabeça, boca e peito é prova de que uma voz está completamente amadurecida, encorpada”.

CONSTITUIÇÃO FÍSICA
A constituição física de um cantor é de suma importância na determinação de seu Fach. Altura, porte e personalidade contribuem fortemente para isso. Algumas características físicas podem ser manipulados em palco. O tenor italiano Mario del Monaco sempre usou saltos em seus calçados, o que aumentava sua altura de 1,70m para 1,82m. Características físicas não constituem grandes desafios, já que figurinos, maquiagem e perucas podem disfarçar uma infinidade de falhas e/ou inadequações.

No entanto, a impressão que um cantor transmite no momento da audição, sem figurinos, maquiagem ou peruca, é muito importante no julgamento da adequabilidade de um cantor ao Fach requerido pela casa de ópera. Como constituição física, na maior parte das vezes, anda de mãos dadas com as características vocais de um indivíduo, a aparência exterior é um indicador inicial do som vocal.

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